
*Por: Francisco Nascimento
A recente condenação do humorista Léo Lins a oito anos de prisão em
regime fechado por falas que configuram racismo e discriminação,
acendeu novamente o debate sobre os limites da liberdade de expressão
no Brasil. A pena imposta está em consonância com a legislação
brasileira e os compromissos internacionais de direitos humanos
assumidos pelo país.
Não se trata de censura, tampouco de uma tentativa de silenciar o humor
ou a crítica. Trata-se de responsabilização penal por condutas que ultrapassam qualquer noção legítima de liberdade de expressão. O
discurso de ódio, disfarçado de piada, não tem guarida na
Constituição da República de 1988. Pelo contrário, o ordenamento
jurídico brasileiro expressamente veda manifestações que incitem o
racismo, a discriminação e o preconceito, inclusive sob forma
artística ou humorística.
Vale lembrar que, no Brasil, promover, apoiar ou relativizar ideologias
como o nazismo ou a escravidão, é crime. A razão é histórica e
humanitária. Foram ideologias e sistemas que geraram sofrimento
inenarrável a milhões de pessoas negros, judeus, indígenas, pessoas
com deficiência, LGBTQIA+ e outras minorias. O Estado brasileiro, por
meio da Constituição, do Código Penal e de tratados internacionais de
direitos humanos dos quais é signatário, adotou postura de tolerância
zero com esse tipo de discurso.
É nesse contexto que se insere a decisão judicial que condenou Léo
Lins. Suas falas não apenas ofendem a dignidade humana, como
representam uma afronta à memória histórica e à ordem jurídica
democrática. Em seus discursos, o humorista tenta replicar um modelo
importado dos Estados Unidos onde podcasts e conteúdos humorísticos
gozam de maior permissividade legal. Contudo, o Brasil não é os
Estados Unidos. Aqui, os direitos fundamentais, como a dignidade da
pessoa humana e a igualdade, têm peso constitucional e formam
cláusulas pétreas.

Não se pode comparar o que ocorre em um podcast com uma encenação
ficcional. A atriz que interpreta uma vilã em uma novela não está
promovendo ideologias de ódio; está representando um papel. Léo Lins,
por sua vez, usa sua voz e plataforma para propagar ideias
discriminatórias, na realidade, e sob o pretexto de liberdade de
expressão. Mas, como já firmou o Supremo Tribunal Federal, a liberdade
de expressão não é um direito absoluto. Ela encontra limites quando
colide com outros direitos fundamentais, como o respeito à dignidade
humana e a vedação ao racismo e ao preconceito.
A decisão da Justiça reafirma o compromisso do Estado brasileiro com
os valores democráticos e com a proteção das minorias historicamente
marginalizadas. Não há espaço, em um Estado de Direito, para a
banalização da dor alheia ou para a naturalização do preconceito.
A Constituição Federal de 1988 é clara ao dizer que o racismo é
crime inafiançável e imprescritível. E ao criminalizar esse tipo de
conduta, o Brasil envia uma mensagem inequívoca: discursos de ódio
não serão tolerados. O humor que fere, que humilha, que inferioriza,
que mata simbolicamente, não é humor. É violência. E, como tal, deve
ser combatido com o rigor da lei.
O caso de Léo Lins serve como um marco para reafirmar o pacto
civilizatório sobre o qual se assenta a nossa sociedade. A liberdade de
expressão é um dos pilares da democracia, mas não é, nem nunca
será, um salvo-conduto para preconceito ou incitação ao ódio. E a
Justiça brasileira deixou isso muito claro.

Francisco Nascimento, é professor de Direito Constitucional e especialista
em Processo Penal da Estácio.
- Os conteúdos assinados, são de responsabilidade de seus autores.
Parabéns. Excelente reflexão.